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O nascimento da ficção científica: influências e primeiras obras

É comum a afirmação de que a literatura de ficção científica começou no século XIX. Uma dentre muitas definições de “ficção científica” parte do pressuposto de que a apreensão do enfoque científico é essencial ao gênero, e a ciência, como agora é compreendida, começou a se firmar de maneira generalizada somente após o Iluminismo. 

Em outras palavras: não seria possível escrever ficção científica sem o conhecimento e entendimento do que é ciência. Esta análise é comum principalmente entre autores estadunidenses, e faz sentido quando se pensa o gênero como o vemos hoje, fortemente associado à cultura pop. 

“Frankenstein” (1818), de Mary Shelley, é comumente considerado o primeiro livro de ficção científica da história. Capa da edição de 1886.

Uma análise mais ampla, entretanto, considera a ficção científica uma visão técnica e materialista sobre o universo, em contraposição à clássica abordagem mística, religiosa e sobrenatural da narrativa fantástica. Por essa perspectiva, a base para o desenvolvimento da sci-fi começou a surgir muito tempo antes. 

Proto-ficção científica e novas noções sobre o Universo 

Entre 160 e 180 d.C., Luciano de Samósata escrevia “A História Verdadeira”, que narra uma viagem à Lua e uma guerra entre “povos da Lua” e “povos do Sol”. Obras como essa, que antecedem o período de consolidação da ciência, são consideradas proto-ficção científica, e a novela (gênero literário) é muito associada às primeiras manifestações de narrativas desse tipo. 

Há um salto de 1400 anos entre a proto-ficção científica de Luciano e o início de uma teorização cosmológica mais racional. A noção de que o universo é infinito e dotado de inumeráveis mundos possivelmente habitados era defendida no século XVI — período da Revolução Científica — por Giordano Bruno. Foi o início de um pensamento determinante para o imaginário de obras de sci-fi.

Iluminismo e primeiras obras de ficção científica 

Foi durante o Iluminismo que a lógica e a razão começaram a se firmar como modo de pensar predominante entre filósofos e intelectuais, assim como a ciência pautada em experimentação e evidência. A literatura se aproximou da ciência, e o trabalho de Isaac Newton, por exemplo, serviu como inspiração para poetas da época. 

As consequências da razão iluminista sobre a literatura de ficção científica são inicialmente notadas em narrativas futuristas, comuns em romances do início do século XIX. Observa-se um especial interesse pela temática do fim dos tempos e um último indivíduo vivo. Um exemplo é “Le Dernier Homme” (1805), de Jean-Baptiste Cousin de Grainville.

Mas é “Frankenstein” (1818), de Mary Shelley, a obra mais comumente associada ao início da literatura de ficção científica, seguida por Edgar Allan Poe, com títulos como “The Unparalleled Adventure of One Hans Pfaall” (1835) e “Mellonta Tauta” (1849). 

Na mesma época foi publicado “Napoléon et la Conquête du monde” (1836), de Louis Geoffroy, e anos mais tarde foram escritas as célebres obras de Júlio Verne, como o clássico “Viagem ao Centro da Terra”, de 1864, e H. G. Wells — “A Guerra dos Mundos”, 1898, dentre vários outros títulos.


Ilustrações de Édouard Riou para a primeira edição de “Viagem ao Centro da Terra” (1864), de Júlio Verne. 

A popularização da literatura de ficção científica começou no fim do século XIX, com o surgimento das primeiras revistas pulp. Tratavam-se de publicações de baixo orçamento, impressas em papel barato, cuja proposta era a venda em massa. Nomes como Edgar Rice Burroughs, Conan Doyle — o criador de Sherlock Holmes, poucos sabem, também escreveu ficção científica — e o próprio H. G. Wells publicaram seus trabalhos nessas revistas, no início de suas carreiras.  

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